30/08/2013 às 00:00:00 – Atualizado em 29/08/2013 às 22:05:28
Sete anos depois, o alemão Lothar Matthäus pede desculpas à torcida do Clube Atlético Paranaense e confessa que errou ao abandonar o Furacão: “Se pudesse mudar uma decisão na minha carreira, como jogador ou técnico, seria esta. Não fui correto”, – lamenta Matthäus numa entrevista ao globoesporte.com, ao relembrar sua polêmica passagem como treinador do Atlético Paranaense.
Entre janeiro e março de 2006, da ascensão e queda do antigo Rei da Baviera, acompanhei as aventuras do ex-craque da seleção alemã em Curitiba na minha coluna na Tribuna do Paraná. Depois de agredir em Foz do Iguaçu o fotógrafo Jader da Rocha, sua última cena antes de bater em retirada, contei com exclusividade os detalhes da estupidez. Com o título de “A queda do Rei da Baviera”, a crônica foi republicada no blog do jornalista Kfouri, com um número impressionante de comentários.
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A QUEDA DO REI DA BAVIERA: Os tempos mudaram. Antes, quem derrubava técnico de futebol era o advogado e jornalista Augusto Mafuz, que assina na Tribuna a coluna mais lida da imprensa esportiva paranaense. Agora, quem derruba técnico é fotógrafo. E literalmente, com um cruzado de direita, justo no olho do alemão Lothar Matthäus, técnico do Atlético.
O craque Matthäus dispensa adjetivos. Na sexta-feira, bem poderia também ter dispensado os adjetivos e insultos contra Jader da Rocha, fotógrafo de reconhecida competência. Do alto de seu pedestal, Lothar Matthäus devia ter ficado mudo, como convém a um ícone do futebol mundial. Falou o que não devia e tombou no mármore do Hotel Rayon. Foi o desfecho lamentável do filme triste que tem a trilha sonora dos Rolling Stones, os cenários exuberantes de Copacabana e cenas de tensão em Foz do Iguaçu, onde a trama começa.
Depois de comandar o Atlético em São Luiz do Maranhão, pela Copa do Brasil, numa quarta-feira, Matthäus fez escala no Rio de Janeiro para assistir ao show dos Stones, no sábado, ao lado de Beckenbauer e mais um time de astros e estrelas na área vip. Não faltaram fotógrafos, não faltaram poses. Na manhã seguinte, um avião particular levou Matthäus a Foz do Iguaçu. O Atlético jogaria em Rolândia, no Norte, pelo Campeonato Paranaense. Lá, o Rubro-Negro se deu bem e o alemão também, já que a cidade é de colonização tedesca. Após a goleada atleticana, o técnico retornou a Foz do Iguaçu.
Os motivos que levaram Matthäus ao périplo de Oeste a Norte e de volta ao Oeste foram de ordem legal, para regularizar seu visto de turista. E também para isso o Paraguai serve, além das compras do tradutor de Matthäus, que precipitou a parte triste deste filme. Sabendo que o alemão precisaria forçosamente ficar na segunda-feira em Foz, para carimbar o passaporte na fronteira, a revista Caras pautou ensaio fotográfico de Jader da Rocha, com Lothar Matthäus junto às cataratas.
A produção de Jader foi à altura do astro: reservou acesso especial ao Parque Iguaçu, acompanhado de autoridades locais. Até os quatis se perfilaram para recepcionar o privilegiado turista alemão. Tudo nos conformes, não fossem as compras paraguaias do tradutor de Matthäus, fora da agenda e do percurso, que deixou o alemão uma arara, bem mais brava que as nativas da região. Mesmo assim, o jornalista Jader da Rocha conseguiu levar a arara até a borda das cataratas. Só não conseguiu cumprir a pauta, fazer a arara posar para os retratos. Por um capricho de paciência dos deuses do futebol, Lothar Matthaüs destratou Jader da Rocha, não cumprimentou nem os quatis perfilados e tomou o rumo de Curitiba. Assim, a Caras ficou sem a cara famosa.
No meio desse filme triste, a revista Placar da semana passada publicou reportagem de duas páginas analisando a vinda de Matthäus para os campos do Paraná: “Dupla face: ao contratar Matthäus, o Atlético-PR empolgou seus torcedores e ganhou visibilidade. Mas trouxe um técnico temperamental e com péssima reputação”.
Certo ou errado, o repórter Frank Kohl reportou o que viu e ouviu. Equivocada e desastrosa era a legenda da foto de Matthäus junto da bela jornalista Delisiê Teixeira, repórter da Globo paranaense: “Marijiana e Matthäus: eles vão morar juntos só depois da Copa”. Com a revista em mãos, quem ficou uma arara foi a mulher do técnico, a sérvia-montenegrina Marijiana. Matthäus virou apenas uma onça. Arara e onça estão processando a revista Placar.
Na quarta-feira, o Atlético empatou com J. Malucelli, time do banqueiro Joel Malucelli. Aliás, também vítima de foto trocada na mesma edição da Placar. Joel é pessoa gentil e cordial: ligou para os editores e simplesmente solicitou a publicação de errata na próxima edição. Nada mais, nada menos.
Ganhando de um a zero, o Furacão da Baixada deixou empatar no final do segundo tempo. Na lateral do campo, o técnico mostrou suas garras ao bandeirinha e à torcida, que ainda não conhecia o outro lado do astro.
O jornalista Jader da Rocha é profissional como poucos. Titular de concorrida coluna de variedades no jornal O Estado do Paraná, é experiente fotógrafo free-lancer de publicações nacionais e internacionais: as revistas Caras, Veja, Placar (fotos e legendas trocadas não são dele, frise-se) e o semanário alemão Der Spiegel, por exemplo. Foi acompanhado de jornalista desta revista que Jader se dirigiu ao Hotel Rayon, na manhã de sexta-feira, 3 de março, para fotografar Matthäus sendo entrevistado pelo enviado especial da Alemanha.
Arara ou onça, tanto faz. Quando Lothar Matthäus botou os olhos em Jader de estatura baixa, gordinho, pele morena e com os cabelos encaracolados num descontraído rabo-de-cavalo, fazendo o gênero paz e amor dos anos 70s, o dedo em riste do alemão veio em direção ao nariz do fotógrafo, acompanhado de palavrões que deixariam Goethe e Shakespeare ruborizados: do inglês, “sonofbitch!” e “motherfucker!” foram duas das frases que acompanharam o dedo em riste. Outros insultos, em alemão, nem os seguranças de Lothar entenderam.
Depois de muito humilhado, o fotógrafo tomou o telefone celular e ligou para outro colega fazer as fotos. Assim que o profissional botou o celular no bolso, Matthäus voltou a investir com o dedo em riste e os mesmos insultos. Um segundo, dois segundos, uma eternidade, a honra não conta o tempo. A celebridade jamais esperava que daquele gordinho de pele morena e cabelos encaracolados, um punho se fechasse e um braço se erguesse.
Um murro apenas, num olho apenas, assim foi a queda do rei da Baviera.